quinta-feira, 31 de julho de 2008

A carteira perdida

Eu nunca parei pra pensar nisso, mas se eu tenho um talento que é especial e intransferível, esse talento é perder.

Não achem que eu vou dar uma de emo-neo-gótico-Kurt Cobain nesse post e começar a falar que sou um perdedor e que minha vida não vale nada mimimi. Afinal de contas, esse é um blog sério e adulto. Cof.

O negócio é que eu perco muito. Eu perco desde o programa que quero ver na TV até a chave de casa no bolso esquerdo. Eu costumo procurar na cintura. Só não perco o pescoço porque tá preso na cabeça. Ou algo assim.

Dentro desta especialidade há um quesito que se destaca: perder carteiras. Eu perco carteiras que é uma beleza. Se eu pudesse fazer uma coleção de carteiras perdidas, eu seria um dos maiores colecionadores do mundo, além de ser o maior ninja do universo. Porque colecionar algo que já está perdido é bastante complicado e requer muita habilidade.

Há alguns dias perdi, novamente, minha carteira. Tive vontade de mandar meu cachorro ir à polícia pra dar parte, porque já tou de saco cheio de fazer esse procedimento. Mas infelizmente os policiais não conhecem o Banzé, então eles iriam enxotar o bicho feito um cachorro sem dono. E ele tem dono, coitado.

O talento de perder carteiras traz esse fardo. Há uma série de procedimentos que devem ser feitos quando alguém perde uma carteira onde carrega até as avós - o que é quase literal no meu caso, pois eu tinha fotos das minhas duas avós dentro da carteira. Depois de ir à polícia e registrar a perda dos documentos, a gente tem que tratar de tirar novos documentos. Comecei pela carteira de motorista e descobri que só podia fazer a 2ª via com minha identidade em mãos. Então parti para o Instituto de Identificação, e só lá me lembrei - mentira, me lembraram - que é necessário a certidão de nascimento pra fazer uma identidade nova.

Idas e vindas depois e com a tal certidão nas mãos, voltei ao Instituto pra fazer minha identidade. Lá eu esperei feito uma mula, a despeito que eu não sei como mulas esperam, muito menos se elas de fato esperam alguma coisa. Eu esperei jogando Paciência no celular, e acredito que mulas não jogam Paciência no celular. Então dizer que eu esperei feito uma mula é uma jumentice da minha parte.

Após 150 tentativas e apenas uma quebra de recorde no jogo, fui chamado pra preencher o negócio todo. E a 4ª Lei de Newton foi descoberta: é completamente nula a possibilidade de tirar uma foto boa para Carteira de Identidade. Na última eu até disfarcei direitinho, mas nessa nova o negócio alcançou uma amplitude tal que eu tenho medo que a carteira pegue fogo e queime praticamente toda a minha vida junto.

190 anos de fila no banco e mais 2 recordes de Paciência depois, consegui pagar a taxa do documento e fui pra casa. Em casa , minha mãe e eu debatíamos acerca da morte da carteira e do universo como um todo, enquanto ela terminava de arrumar o terno que eu usei no fatídico fim de semana que perdi a carteira, quando...

- Essa calça não é desse terno.

Antes de mais nada, eu devo dizer que moda, para mim, é algo tão nulo que eu me visto mal por instinto. Assim como a leoa corre atrás da zebra, como o cachorro faz círculos antes de deitar ou mesmo quando a mulher tem dores de cabeça do mais absoluto nada, eu me visto mal. Sendo instinto, nada mais natural do que eu vestir um terno diferente da calça, certo?

Errado, lógico.

Talvez esse mesmo instinto tenha levado minha mãe até o guarda-roupa para verificar os bolsos da outra calça.

Vamos dedicar este parágrafo para fazer uma pausa reflexiva. Parem com tudo o que vocês estão fazendo e me respondam: é possível alguém guardar a calça que usou na noite anterior em um lugar e procurar uma carteira perdida também na noite anterior no bolso de OUTRA calça? A resposta é "sim", mas unicamente se o "alguém" em questão for este que vos escreve.

Aproveitemos o ritmo da reflexão: adivinhem vocês, ilustres leitores, o que ela achou no bolso da outra calça? Uma camisinha? Uma bala de hortelã? O bilhete sorteado da Mega-Sena acumulada? A carteira perdida?

Eu não preciso nem dizer qual a opção correta.

Certos talentos trazem certos fardos, e não são de cerveja.
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