quinta-feira, 3 de março de 2011

Uma traumatizante experiência culinária

Eu invejo homens que sabem cozinhar. E invejo com força. Invejo homens cozinheiros porque eles sabem diferenciar certos alimentos, e aqui me refiro especificamente a manjericão, salsinha e couve. Se eu liderasse as panelas durante o preparo de um almoço e pedisse qualquer um desses três itens, podiam me trazer até um maço de capim colhido à beira da árvore do vizinho que eu não notaria a menor diferença. E ainda arrotaria caviar.

Não sou nenhum Indiana Jones quando me dirijo à cozinha, como fazem parecer o Anonymous Gourmet ou o Olivier Anquier, estes desgraçados - perdão, é a inveja. Mas eu não morro de fome se precisar me aproximar do fogão para fazer algo mais que esquentar a água do chimarrão. É mais provável que eu morra envenenado - sem perceber que fui envenenado, e quiçá sem perceber que morri. Não vou à cozinha apenas apra correr o risco de quebrar pratos - eu até me viro muito bem na cozinha. Hoje mesmo, almocei um suculento Miojo sabor carne. Além disso, descongelo uma lasanha congelada como poucos, sei abrir latas de ervilha, milho e atum; não obstante, sei fazer um arroz bastante apropriado para esta época do ano, porque é um arroz carnavalesco. Ele sai em bloco - mas não sem antes ter transformado o fogão numa bagunça feliz.

Também sei fazer ovo mexido (conhecido em outras querências como "omelete", mas não vou me referir a este famoso prato desta maneira - afinal, já estou em Pelotas e o que é um peido pra quem tá todo cagado?). Todos os pratos que me referi como capaz de cozinhar obedecem à velha máxima da cozinha dos solteirões: "o melhor tempero que existe é a fome". E com relação ao meu ovo mexido, ele não é um ovo mexido qualquer. Ele nem sequer é um: são três ovos que vão dançar dentro da frigideira, deslizando no óleo de cozinha, no ritmo do garfo que empunho, enquanto despejo, aos poucos, algumas pitadas de sal que torço que não seja flagrada para alguma câmera escondida, o que causaria preocupação extra para meu médico.

Assim que o conteúdo da frigideira adquire uma forma mais sólida, desligo o fogo. Então despejo um pouco de orégano e, munido de um tubo de catchup e uma lata de azeite, vou degustar minha obra culinária, o que faço na própria frigideira, porque sou um rapaz muito consciente e não gosto de sujar louça à toa. Ter que lavar tudo depois é um saco.

Como vocês podem perceber - e eu já deixei claro -, não sou nenhum Indiana Jones da culinária. Nunca tive grandes apertos ou experiências horríveis à beira do fogão - isto é, até alguns dias atrás, quando, faminto, recorri à minha infalível receita de ovo mexido. Foi traumatizante demais. A frigideira já estava no fogão, quando eu quebrava o primeiro dos três ovos e o colocava na frigideira.

Mas havia algo errado.

Assim que o ovo se esparramou pela geladeira, percebi que sua clara tinha um forte tom marrom, ao invés do límpido transparente que lhe é comum. Instantaneamente, um cheiro ruim foi liberado. Com o intuito de conferir se o cheiro tinha origem no conteúdo que a frigideira acabara de receber, este inexperiente e incauto projeto de auxiliar de cozinheiro que vos escreve resolveu aproximar o nariz da frigideira e dar uma forte inspirada.

E foi como se Mike Tyson tivesse me dado o mais forte murro da sua carreira bem no meu nariz. Eu estava descobrindo, naquele exato instante e na prática, o que era um ovo podre.

Corri da cozinha o mais rápido que pude em busca de 2 itens valiosos: ar puro e um telefone celular, de onde liguei para minha mãe, afim de descobrir se ela tinha o telefone de alguma coletora de lixo atômico ou mesmo da polícia, para quem eu denunciaria a agressão olfativa que eu havia acabado de sofrer. Cinco minutos se passaram até que meu cérebro tivesse oxigênio suficiente para entender o conselho da minha mãe: jogar o ovo podre pelo esgoto do pátio.

Ao retornar para a cozinha - tomando o cuidado de respirar o mínimo possível -, vi que não estava sozinho. Uma gigantesca mosca azul admirava, serenamente e de camarote, o forte marrom da clara do ovo que jazia na frigideira. A mosca era tão gigante que podia tranquilamente ser o bicho de estimação do já citado Mike Tyson, o que me fez crer que, de fato, ele estivera ali e, sim, havia desferido-me um potente murro olfativo no meio do meu nariz.

Timidamente, abanei a mão perto da mosca e, em voz alta, ordenei que ela saísse dali. Acreditem: ela preguiçosamente levantou vôo e se dirigiu diretamente para a abertura da janela, saindo para nunca mais voltar. Sequer ficou para ver o despejo do ovo podre pelo esgoto - o que aumenta a possibilidade de ser um inseto domesticado. Mike Tyson, o senhor não perdeu uma mosca?

Foi uma experiência que me fez pensar demais: homens conseguem diferenciar manjericão, salsinha, couve e capim; ora, os homens já foram à Lua!

Porque raios não é possível diferenciar um ovo bom de um ovo podre sem sofrer uma agressão?