segunda-feira, 29 de novembro de 2010

Sobre pombas e sua arte de evacuar

"(...)
As pombas, quando avoam,
por incrível que pareça,
ficam sobrevoando, com seu cu amirando
em nossas cabeças

Daí vem a rajada
de sua bazuca anal;
já tem pomba com mira laser:
o tiro sai sempre fatal
(..)"

Não gosto de textos que comecem com uma citação musical, mas neste caso é inevitável. Talvez poucos saibam disso, mas a composição de Dinho (ex-filósofo, ex-vocalista do Mamonas Assassinas e atual finado) demonstra muito mais que uma anedota popular sobre as pombas, estas nada-higiênicas aves. Afirmo isso porque pude observar, há algumas semanas, o comportamento das pombas - principalmente no que tange o despacho de seus excrementos, a famosa "cagada".

Aconteceu há algumas semanas. Eu estava em Porto Alegre com a minha família, convidados para um casamento que éramos. Era um sábado e eu acordei consideravelmente tarde, o que me impediu de acompanhar meus parentes no almoço em um restaurante próximo. De modo que, quando cheguei ao restaurante, mal tive tempo de dizer "tchau" ao meu cunhado, que era o último a se retirar da mesa. Fiquei ali, almoçando em companhia de meus pensamentos e de um casal em uma mesa próxima, que estavam com um micro-poodle branco, tão micro e tão branco que, se cometesse a indiscrição de subir na mesa, poderia facilmente ser confundido com o punhado de arroz no prato do casal.

Mas divago. O animal em debate neste texto é a pomba.

Meu solitário almoço transcorreu tranquilamente, a despeito do nervosismo que eu estava por ter a mais absoluta certeza que o micro-poodle branco ia, a qualquer momento, levantar a patinha e demarcar território, mijando no pé da mesa e da moça do casal - o que não aconteceu. Devidamente almoçado (sem mensagens subliminares do tipo "eu estava comido" aqui), percorri o curto caminho entre o restaurante e o apartamento que minha família e eu estávamos hospedados. E o fiz distraidamente, sem perceber os perigos pombais que me rondavam.

Cheguei são e salvo, mas fui surpreendido por meus familiares analisando minha roupa, minha cabeça e meu portentoso par de sobrancelhas. Todos intactos.

- Ué, não tás sujo? - perguntaram-me.
- Não. - Respondi - Deveria?
- Olha, eu acabo de levar um banho de cocô de pomba. - Era meu cunhado, a esta altura já de banho tomado e roupa trocada.

Quando vi as roupas que foram mortalmente atingidas pela bazuca anal das pombas, fiquei impressionado: as aves praticamente conseguiram representar a política mundial. A cagada foi de uma agressividade norte-coreana, um estrago químico de uma arma iraniana e um deboche brasileiro, pois quase pude imaginar a pomba dizendo "é só uma marolinha".

E o pior é que a história não acaba aqui. Algum tempo depois, fomos - meu cunhado e eu - dar uma volta com meu sobrinho. Quando saímos, as pombas se alimentavam no chão. Mas quando retornamos...

(Eu juro que é uma história real. Eu juro que vi as pombas fazerem isso. Se eu não tivesse visto com meus próprios olhos, não teria acreditado.)

Quando retornamos, ficamos de olho nos céus, buscando desviar de uma possível mira laser pombal. Avistamos duas pombas no terceiro andar do condomínio onde estávamos, em um buraco onde deveria estar um ar-condicionado, exatamente na calçada onde passávamos. As duas estavam de olho nos transeuntes e também nos avistaram, temos certeza disso. E só temos essa certeza porque, quando vimos as aves, uma delas virou sua bazuca anal em direção ao ponto da calçada onde estávamos prestes a passar. Cientes do perigo que corríamos, resolvemos passar pelo meio da rua.

Acreditem: ao fazermos isso, a pomba desistiu da cagada e recolheu sua bazuca anal, tornando a ficar de olho nos pedestres que passaram. Certamente ela foi avisada pela companheira que meu cunhado e eu não estávamos mais na mira delas. Cientificamente falando, deve ser o primeiro caso de "aborto de cagada pombal" - pelo menos é o primeiro que eu tive notícia. E filosoficamente falando, concluí que a poesia de Dinho é imprecisa.

As pombas não precisam avoar para que seus cus fiquem amirando em nossas cabeças.