Minha mãe não cansa de reclamar do preço do queijo. E eu reclamo junto, porque tem uns queijos muito bons. Eu me considero um degustador de queijos, a despeito de eu não entender patavinas do assunto. Meu paladar, aliás, só é melhor que a visão do Stevie Wonder.
Mas voltando à inflação, Fernando Henrique Cardoso afirmou que o que importa é que o povo está comendo mais frango. Dizem que muitos goleiros se emputeceram com a frase, mas o que acontece é que essa é uma afirmativa ultrapassada: segundo uma pesquisa minha no Google (mais rápida que o Schumacher montado num cometa), o preço do frango aumentou 26%. Como não sou bom em matemática e muito menos em porcentagens, me contento em dizer que os goleiros devem estar bem satisfeitos com esse aumento.
Parece que o tomate e o arroz também aumentaram muito. Nesse ponto minha mãe enlouquece: ela come tomate como se fosse pipoca. Não literalmente, porque aí ela teria que colocar óleo em uma panela e deixar o tomate estourar. Falo em quantidade.
Tenho um amigo que é alérgico à tomate. Acredito que ele deve estar bastante contente com o aumento no preço do tomate. Já o arroz, bem, esse deixa pra lá. Só vou falar alguma coisa quando o carreteiro estiver sendo seriamente afetado.
A desgraça da inflação é tanta que atinge os setores mais inimagináveis. Vocês acreditam que o Sorinan, um genérico do Sorine, que salva a minha respiração e bane temporariamente a minha tremedeira, está quase CINCO reais? Um absurdo! Eu costumava pagar menos de três reais. E olhe lá.
Mas vocês já ouviram falar em inflação capilar? Eu já.
Como vocês podem imaginar, eu tenho uma ligação capilar com o mundo. Sou basicamente o retorno do Sansão - o chifrudo da Dalila e não o coelhinho da Mônica. Algumas pessoas dizem que eu sou feio, e isso se deve ao meu cabelo: se eu não tivesse cabelo, o termo mais correto seria "pavoroso".
Meu cabelo é uma das maiores provas da inflação que ronda a economia brasileira. Não me refiro a cremes, basicamente porque eu não uso cremes. Isso é coisa de quem cuida do cabelo. E também não me refiro apenas a shampoos, apesar de estarem caros feito o petróleo.
Me refiro também ao cabelo propriamente dito. Não foram raras as vezes que me fizeram ofertas em dinheiro pelo meu cabelo.
- Egídio, que cabelo bonito! Te dou 70 pila nele.
- E não ganho nem um beijinho?
- Rapaz, esse teu cabelo é demais. Se um dia resolveres vender ele, consegues uns 200 ou 400 reais, tranqüilo.
- E com 400 reais eu compro uma mansão perto da Roselyn Sanchez?
- Bem, não, mas...
- Tchau hein. A gente se fala.
A variação financeira era basicamente nessa faixa monetária. Essa frase dá mais ou menos uma idéia do que é ser cabeludo, além de me capacitar como comentarista econômico do Jornal da Globo.
Mas a inflação tá aí, né?
Então. Outro dia eu tava na delegacia pela cagagésima vez, registrando perda de documentos que seriam achados menos de 10 horas depois, quando me chegou uma proposta indecente, em alto e bom tom.
- Bonito cabelo.
- Aham.
- Quer vender? Te consigo DOIS MIL REAIS nele, fácil. Tem uma mulher em Porto Alegre que compra pra fazer peruca e...
O tamanho do borrão que tomou conta da minha cueca naquele momento é comparável com o aumento do preço do frango. Uma proposta daquelas, dentro de uma delegacia cheia de gente, significava que ladrões de alta periculosidade estavam de olho em uma capilar oportunidade de ganhar dinheiro fácil.
Mais tarde, percebi que isso foi um lapso da minha parte. Ladrões em uma delegacia? Não me parece certo.
Ouvi dizer que eles estão tentanto controlar a inflação, diretamente de Brasília.